Bagatelas
Prefácio
Alfonso Benetti
As Bagatelas para piano de Frederico de Freitas consistem em um conjunto de 10 peças curtas, provavelmente compostas entre 20 e 24 de Setembro de 1953. Caracterizada sobretudo pela simplicidade melódica e exploração rítmico-harmónica, “a obra pauta-se pela utilização de elementos tradicionais, nomeadamente nas peças n.º 5 (Allegretto à maneira popular), n.º 7 (Quasi allegro com a indicação piano e gracioso ao modo de dança rústica), [e] n.º 9 (Rogal canto fúnebre)”¹. A Bagatela n.º 5 é claramente inspirada no Fandango Ribatejano - dança típica da região do Ribatejo, em Portugal (a mesma característica pode ser observada no segundo andamento da Sonata para Violino e Violoncelo de Frederico de Freitas - Scherzo Pittoresco). A peça n.º 6 também traz a indicação Allegro truanesco – provavelmente alusiva às festas populares de Carnaval². Pelo seu padrão rítmico e contorno melódico, a Bagatela n.º 7 foi provavelmente inspirada em danças tradicionais portuguesas. Em relação ao título da Bagatela n.º 9, e conforme a própria definição do compositor, “rogal” refere-se às cantigas entoadas durante a execução da pena de morte de um condenado³.
De maneira geral, a obra não parece ter recebido grande atenção nos primeiros 20 anos que se sucederam à sua composição: a única referência à obra nas cartas do compositor surge em uma listagem da sua obra para piano elaborada em 1978; da mesma forma, a obra não figura em nenhum programa de concerto do espólio do compositor (à guarda da Biblioteca da Universidade de Aveiro), e não existem registos de performances ou gravações da obra neste período.
A partir de 1973 a obra assumiu discreta relevância ao ser incluída no programa oficial de piano dos conservatórios de Portugal? – o qual indica as Bagatelas n.ºs 1, 2, 5 e 7 para os 5º e 6º anos, a Bagatela n.º 4 para os 7º e 8º anos e 2º ano do curso superior, e as Bagatelas n.ºs 8 e 10 para o 3º ano do curso superior. No entanto, mais de 50 anos após a sua composição, a obra ainda não figura nos programas de concerto e não foi gravada.
Referida por Hinson e Roberts? como uma obra “curta, variada, [com] mistura de estilos”, as Bagatelas de Frederico de Freitas enquadram-se na tipologia de repertório semelhante às Cenas Infantis Op. 15 de Schumann: uma obra leve e fluente, articulada, contrastante, formalmente rigorosa, e reveladora de um colorido singelo e intimista. As peças apresentam os seguintes títulos e datas:
Bagatela n.º 1 – Vagarosamente (Porto, 20.9.1953);
Bagatela n.º 2 – Allegro/staccato (Porto, 20.9.1953);
Bagatela n.º 3 – Largo/desoladamente (Porto, 20.9.1953 – provavelmente revisada posteriormente no Porto ou em Lisboa);
Bagatela n.º 4 – Allegro molto leggiero (Porto, 20.9.1953);
Bagatela n.º 5 – Allegretto/à maneira popular (Lisboa, 23.9.1953);
Bagatela n.º 6 – Allegro truanesco [não especificado / provavelmente Lisboa, 23.9.1953];
Bagatela n.º 7 – Quasi allegro/gracioso, ao modo de dança rústica (em viagem do Porto a Lisboa, 20.9.1953);
Bagatela n.º 8 – Allegro vivo/quasi presto (Lisboa, 24.9.1953);
Bagatela n.º 9 – “Rogal” – Canto fúnebre/largo [local e data não especificados];
Bagatela n.º 10 – Marcha Grotesca / tempo de marcha (Lisboa, 23/24.9.1953).
¹ André Vaz Pereira, “Obras para Piano a Solo e Piano com Violino ou Violoncelo de Frederico de Freitas: Fontes, Contextos e Edição (Tese de doutoramento, Universidade de Aveiro, 2017), 104.
² A designação “truanesco” remete ao período do “entrudo” e ao “truão”, ou seja, as festividades populares de Carnaval - o que justifica o carácter jocoso desta Bagatela.
³ De acordo com o Novo Dicionário Compacto da Língua Portuguesa de António de Morais Silva (Lisboa: Editorial Confluência, 1992, p.40) o significado de “rogal” consiste em: “que contém rogos; que envolve rogos. // Relativo à fogueira em que se queimam cadáveres. // Designativo dos cânticos que se entoavam no auto-de-fé em que havia pena de morte a executar”.
Programa oficial de Piano Conforme o Programa de Curso de Piano do Conservatório Nacional de Música (1973/74). Consultado a 05.05.2017 em http://www.conservatoriodebraga.pt/userfiles/file/Escola-programa-de-piano.pdf.
Maurice Hinson e Wesley Roberts, Guide to the Pianist’s Repertoire (Bloomington, Indianapolis: Indiana University Press, 2014), 397.