Cláudio Carneyro dedicou-se à composição de peças para piano durante toda a sua vida. É certamente através das suas obras compostas para este instrumento que se pode apreciar melhor as qualidades técnicas e expressivas da sua escrita musical assim como a riqueza do seu universo estético. Embora não sendo pianista, conhecia perfeitamente as potencialidades do instrumento e as suas obras, desde as peças de carácter pedagógico que ele compôs (Fábulas, 1933) às obras de virtuosidade (Harpa Eolea, 1948), revelam a sua capacidade de realçar o potencial harmónico e a variedade de timbres. A sua obra para piano, assim como a sua obra polifónica (orquestral e vocal), evolui através de diferentes estilos testemunhando diversas influências, tais como a polifonia do século 17 (Pavana, 1939; Cravo mal temperado, 1924; Tento, 1954), o romantismo (Serão, 1925; Poemas em prosa, 1930-31, dedicados a Vianna da Motta), a música popular (Raiana, 1936; Bailadeiras, 1946), a atonalidade (Sob o Signo lunar, 1951). Em várias obras evidencia-se também um universo musical muito pessoal onde predominam efeitos de ressonância em acordes ricos em sobreposições harmónicas e em cruzamentos cromáticos, conferindo à sua música uma densidade de cores e de luzes única (Carrilhões de bronze, 1937; Carrilhões de prata, 1939).
O Movimento Perpétuo, composto em 1955, é a última peça para piano solo do compositor. Esta obra sem tema, construída em torno de tercinas de semicolcheias distribuídas em diferentes métricas (24/16, 12/16, 21/16…), é um jogo de contrações e dilatações de intervalos no qual o compositor varia a amplitude e as ondulações. O clima esotérico e a escrita praticamente atonal desta peça testemunham as orientações assumidas por Cláudio Carneyro na fase final de sua vida. Editada aqui pela primeira vez, a obra é dedicada À menina prodígio Maria João Pires (com 11 anos de idade) que estreou a obra no Conservatório Nacional de Lisboa no ano de 1957.