Coordenação Gustavo Afonso
O Álbum de Música Portuguesa para Jovens Pianistas tem como objetivo permitir o desenvolvimento
de aptidões técnicas e interpretativas, abordando repertório recente e de linguagens não tonais,
e fomentando um conhecimento profundo do instrumento nas suas vertentes mecânica e sonora.
A investigação realizada na área da música dos séculos XX e XXI nas duas últimas décadas1, que
abrange os mais diversos contextos educativos, tem evidenciado as potencialidades deste tipo
de música e o benefício nos planos cognitivo e artístico pela sua inclusão em fases iniciais da
aprendizagem, preconizando um ensino musical centrado no desenvolvimento da sensibilidade
do aluno e na estimulação da sua capacidade de escuta e de criação. O álbum visa ainda promover
a difusão da música portuguesa, com ênfase no trabalho de jovens compositores. Trata-se de uma
antologia de 12 obras originais para piano, dirigidas aos estudantes de música, fruto de um trabalho
de parceria com os/a compositores/a António Chagas Rosa (1960), Vasco Negreiros (1965), Carla
Oliveira (1973), Bernardo Lima (1993), Paulo Banaco (1993) e Miguel Vasconcelos (1998). As peças
foram compostas entre setembro de 2019 e janeiro de 2020, com exceção de Prelúdio (Αρκαδία),
escrita em março de 2014.
A criação deste álbum envolveu um levantamento descritivo prévio dos principais manuais, antologias,
coletâneas de obras e métodos de ensino destinados a crianças e jovens, bem como a análise dos
objetivos e conteúdos programáticos propostos pelos conservatórios oficiais de música para o 3.º
e 4.º graus de ensino do piano. Optou-se por partir de ideias e elementos musicais para chegar ao
trabalho das questões técnicas, pretendendo-se que cada compositor/a deixasse no álbum a marca
singular da sua escrita e das suas influências. Neste sentido, e não obstante o facto de todas as peças
envolverem a abordagem de diversas competências, procurou-se focar, em cada obra, num grupo
específico de questões musicais e técnicas. Assim, foi possível reunir um vasto espetro de valências,
sintetizado nos seguintes domínios: expressividade e estilo; textura e harmonia; sentido rítmico; técnica;
exploração do instrumento e novos recursos.
No domínio da expressividade e estilo, privilegia-se o trabalho da condução frásica, do caráter e do
equilíbrio sonoro, bem como a aquisição de uma paleta de dinâmicas ampla. Merecem igual destaque
a integração de elementos extramusicais na compreensão das obras e na construção da interpretação
pessoal, patente em Sé Velha, Choral e Prelúdio (Αρκαδία), e o contacto com vários estilos e influências,
desde os primeiros registos de uma composição musical completa – o epitáfio de Seikilos – até ao
jazz e à música de Ligeti e de Kurtág.
São abordadas diferentes texturas musicais, como a construção polifónica – e a possível exploração
dos planos sonoros –, a realização de uma melodia acompanhada e a conceção orquestral. A diversidade
harmónica está patente na alternância entre tonalismo e modalismo, na utilização de harmonia
funcional e não funcional, na aplicação de modos de transposição limitada, no emprego da escala
pentatónica e da escala hexáfona, e no recurso a um thāṭ do norte da Índia, com a consequente
novidade a nível das alterações presentes na armação de clave.
O trabalho do sentido rítmico passa pelo contacto com células variadas, pelo domínio da polirritmia,
pela realização de improvisações rítmicas e pela compreensão do balanço associado a compassos e
métricas distintos.
A componente técnica abrange a realização de diversos tipos de articulação e o trabalho de questões
como a coordenação e a independência de mãos, o seu cruzamento, a passagem de polegar e a
“orientação espacial”2, através do cálculo de distâncias na movimentação ao longo do teclado.
O álbum permite ainda a introdução a diferentes formas de notação, oferecendo novas possibilidades
de conhecimento do instrumento. Neste âmbito, realça-se a exploração de efeitos sonoros, com
uma abordagem inicial de técnicas estendidas – como a realização de clusters e a ação direta
das cordas na concretização de glissandi –, e a utilização correta dos pedais aliada à ativação de
ressonâncias do piano.
Não se pretende afastar por completo o universo tonal, mas disponibilizar uma ferramenta capaz
de integrar nos programas vigentes uma dimensão atual da música, invertendo o paradigma corrente
e possibilitando, por essa via, o contacto dos alunos com as linguagens da música erudita do seu tempo.
- Notturno, António Chagas Rosa
- Sé Velha, António Chagas Rosa
- Hommage à György Kurtág, Bernardo Lima
- Hommage à György Ligeti, Bernardo Lima
- Canção de Berço, Carla Oliveira
- Terceiras pluralistas, Carla Oliveira
- Canção, Miguel Vasconcelos
- Choral, Miguel Vasconcelos
- Prelúdio (Aρκαδία), Paulo Banaco
- Valsa quase em mi menor, Paulo Banaco
- Bach na Índia, Vasco Negreiros
- Perpetuum mobile, Vasco Negreiros