Bastante mais tardio é o ‘Sexteto de cordas, op, 65’, terminado a 16 de Março de 1986 (data no manuscrito). O impulso criativo para a escrita desta obra ficou a dever-se a um concerto a que Joly assistiu na Fundação Gulbenkian em que se interpretou a ‘Noite transfigurada’, de Schönberg (também um sexteto), pela Camerata de Alberto Lysy, violinista a quem a obra é dedicada. Ela foi primeiro ouvida na transcrição para orquestra de cordas, pela Orquestra Gulbenkian, dirigida por Grzegorz Nowak, a 10 de Junho de 1986, em Portimão, integrada no X Festival Internacional de Música do Algarve. A estreia da versão original seria já póstuma, a 10 de Julho de 1989, no Teatro Nacional de São Carlos *11.
Em relação aos quartetos, é uma obra de uma linguagem bastante diferente, como seria de esperar dado o seu lugar cronológico na produção do autor. Mas não é tanto da substituição e adopção de uma técnica nova em detrimento de outra que aqui se trata, mas antes do alargamento dos recursos de linguagem disponíveis, que passam a incluir o cromatismo acentuado, o melodismo atonal, modos alternativos de divisão escalar da oitava, o pensamento intervalar em células e harmónico por 4as., modos de execução (ataques, articulações, fraseio) extremamente variados e minuciosos. Trata-se portanto de uma amplificação da linguagem, uma síntese qual a antiga não desaparece por completo: as marcas “típicas” do compositor ainda surgem com frequência, mas agora como que diluídas por entre aquisições mais recentes do seu estilo.
O ‘Molto largo’ está na forma ABA-Coda, com A marcado por melodias dilaceradas (violino1, violoncelo1) e B pintando paisagens harmonicamente estáticas, despojadas e desoladas, nas quais despontam gestos melódicos que parecem “perdidos” e fugazes evocações do melodismo de A. Um ‘attacca subito’ introduz-nos no ‘Allegro ben marcato’: este é quase um exercício de graduais acelerações de ‘tempo’. Formalmente, há uma Exposição (2 temas) e uma Recapitulação, mas o Desenvolvimento é substituído por um tenso caleidoscópio de diferentes ‘ostinati’ rítmicos, que são pretexto para um quase ‘estudo’ dos diferentes modos de execução, numa textura carregada e pontuada por melodias dilaceradas e urgentes. A Coda condensa os “eventos rítmicos” sem atenuar a tensão.
O ‘Andante’ inicial do 3.º andamento revisita de certa forma a atmosfera do 1.º andamento, sendo rematado por sete compassos em harmónicos. Surge então o ‘Allegro’, o qual opera um processo semelhante ao da secção central do 2.º andamento, só que aqui são dois os catalisadores: a transformação melódica e a oscilação métrica – aqui, pelo uso sistemático de diferentes compassos mistos. Um regresso abreviado da secção inicial liga directamente à Coda, na qual uma torrente de semicolcheias desemboca num “arejado” acorde final de 5as. sobrepostas.
Bernardo Mariano