Em Maio de 2008 a Escola de Música do Orfeão de Leiria encomendou-me uma série de pequenas peças destinadas a serem tocadas no ano seguinte ao do prémio pelos vencedores do concurso de jovens intérpretes organizado por essa instituição de ensino, fazendo também parte dos prémios. Escrevi assim dez pequenas peças para os mais diversos solistas e conjuntos, e para os mais diversos graus de aprendizagem: 2 flautas, saxofone, violino e piano, violoncelo e piano, ensemble de percussões (2 marimbas e vibrafone), coro infantil e piano, 2 trombones, piano, guitarra e harpa. As peças têm atmosferas e estilos diferentes, desde a gravidade da peça de guitarra até à escrita quase jazzística (e até “rockeira”) das peças de saxofone e percussão, passando pelo lirismo modal da peça de harpa e pelo humor e brio das peças de violino, violoncelo e trombone. A intenção foi enriquecer o repertório de estudo para estes instrumentos, embora a maior parte das obras, se não todas, pouco ou nada tenha que ver com a ideia de “música didáctica”, por norma mais “didáctica” que “música”.
O Sono do João, sobre o lindíssimo e conhecido poema de António Nobre (tragicamente desaparecido em 1900, com apenas 33 anos) vem culminar uma série de meses de composição especialmente dedicados à escrita de canções para coro de crianças e piano (entre fins de 2007 e Maio de 2008), e é a mais importante peça desse grupo, dada a qualidade do texto, por um lado, a duração da música, que ronda os 12’, e ainda o facto de estar escrita para dois coros, enquanto a maior parte das canções são ao uníssono. Também a escrita é mais sofisticadas, nomeadamente a nível da notação musical, muito mais detalhada que nas canções. O Sono do João é muito mais uma cantata coral do que uma canção simplesmente estendida no tempo, dada a riqueza do texto (que já há uns dois anos pensara em musicar), e a variedade da música. Não obstante essa variedade, uma atmosfera de sonho e recolhimento intimista – fazendo jus ao poema – dominam a cantata. Penso que a profundidade filosófica do poema de Nobre poderá talvez ser demasiado exigente para a imediata compreensão de uma criança, porém, será a música que, neste caso, se encarregará de tentar transmitir às crianças o sentimento da visão do Poeta, assim eu o tenha conseguido igualmente lograr.